Suor. Lágrimas. Respiração pesada. Meu desespero é evidente, e não sei se já há motivo para eu me sentir aliviada, já que o meu veículo de fuga é o mais fechado possível. Um elevador. Se não fossem por eventuais pequenos solavancos, eu não acharia nem que estou saindo do lugar. Mas estou, finalmente, prestes a descobrir o que tem lá em cima, além de todo esse metal que me cerca, então relaxo e me deito no chão.

As horas passam, e não há nenhuma alteração no ritmo do elevador, seja acelerando ou parando. Isso me alivia, pois obviamente quero estar o mais longe possível dali, mas ao mesmo tempo uma pequena agonia começa a crescer dentro de mim, e eu tento abafá-la. Mais horas passam, e o desconforto vai crescendo cada vez mais em mim, e apesar de achar que ele é somente psicológico, logo percebo que minhas pernas não estão mais em uma posição tão confortável no piso, estão um pouco mais dobradas do que quando as coloquei ali. Muito estranho. Mais horas passam, e o elevador parece cada vez mais desconfortável, seja simplesmente por ser uma caixa de metal fechada comigo dentro, seja por não ter um espelho que me dê pelo menos a ilusão de algo a mais ali, ou por que… De novo minhas pernas estão apertadas, depois de eu ter dobrado elas mais um pouco a algum tempo. Posso estar louca, mas essas paredes estão ficando cada vez mais próximas.

Se torna difícil ter certeza, ainda mais as paredes sendo todas de um cinza metálico fosco sem nenhuma distinção. Mais horas passam. Mais desconforto. Não vejo mais esperança. Quando as paredes estão perto o suficiente para que eu só consiga ficar em pé, chego a um lugar em que uma das paredes desaparece, e posso finalmente sair.

O lugar diante de mim é um quarto infantil. Não possui nada de muito estranho, mas é como se houvesse um filtro de luz um pouco azulado sobre tudo. No berço uma criança brinca com sua boneca, e não parece ligar para minha presença, se é que percebeu que estou aqui. Enquanto examino o quarto, a porta se abre e uma mulher da minha altura entra, parecendo menos surpresa do que eu esperaria com a minha presença. Tento parecer o menos nervosa e desesperada possível, o que não é muito, ao abordá-la.

— Me ajuda, por favor, eu quero sair daqui.

— Fica calma — ela responde.

— Só me mostra onde é a saída, por favor.

— Isso não tem como eu fazer, mas posso te dizer o que eu sei.

— Como assim?

— Aqui não tem portas. Eu não posso te mostrar uma saída, se também nunca encontrei. Aqui só tem uma janela, mas é uma fuga mais definitiva, digamos assim. Não dá nem para ver o chão daqui.

— Mas como você veio parar aqui?

— Eu não sei dizer. De certa forma sinto que estou aqui desde sempre, quando tento lembrar de algo antes, tudo fica muito confuso e não vejo mais nada. E você, de onde veio?

— Eu vim desesperada em um elevador fugindo… De algum lugar. Que estranho, a agonia de fugir era tão grande, mas não consigo dizer do que era. O que diabos está acontecendo?

— Calma que desespero não vai levar a nada. Também não garanto que calma vá levar, infelizmente.

— E essa menininha ali no berço com a boneca, é sua filha?

— Não, não é minha filha. E não, não é uma boneca.

— Oi?

Volto para o quarto da criança e chego mais perto para entender. Quando viro a “boneca” para ver o rosto, fico horrorizado. O tamanho dela já era um pouco grande, mas agora vejo que parece uma criança mumificada, tudo seco e com aparência de morte, porém preservado. Grito e solto ela em cima da criança, horrorizada.

— O que é isso?

— Eu também não sei ao certo o que aconteceu. Mas a um tempo atrás, esse lugar era muito maior, e estávamos já eu e a criança aqui. Um dia alguém entrou por aquela porta ali do canto. E para minha surpresa, era uma criança idêntica à que já estava aqui. Ela estava ofegante e chorando, mas a outra acalmou ela e começaram a brincar. Só que depois que ela chegou, algumas horas passaram, e vi que tinha algo diferente nas paredes. Pareciam mais próximas. Não dei muita atenção, podia ser só impressão minha também. Mas no outro dia, pareciam ter se aproximado ainda mais, e comecei a ficar nervosa. Mas naquele mesmo dia, uma delas colocou um brinquedo pequeno que tinha aqui na boca e engoliu. Eu tentei ajudar, mas não tenho qualquer lembrança do que fazer num caso assim, então ela acabou engasgando e morrendo. Eu não sabia o que fazer com o corpo. — Seu rosto parece viajar de volta à cena à medida que ela a descreve — O mais lógico talvez fosse jogar pela janela, mas não tive coragem de imediato. E enquanto pensava, fui percebendo algumas coisas Primeiro, o corpo não estava se decompondo como deveria, estava conservado de alguma forma estranha. Conservada o suficiente para que a outra criança continuasse brincando. E segundo, as paredes pararam. Por mais horrível que tenha sido, a morte de uma delas fez com que o lugar voltasse ao normal estático de sempre.

Fico aflita com essa história horrível. Depois de tanta informação e tão poucas respostas, me sinto exausta, totalmente drenada de qualquer energia que pudesse ter. Exaurida que estou, vou encostando no chão aos poucos e logo caio no sono, dormindo por horas e horas. Ao acordar, percebo uma atmosfera estranha. E também uma leve diferença no espaço. Mas que droga, está acontecendo de novo! O espaço está menor. Minha cabeça quer explodir, pensando em várias coisas. O problema será eu? Estou causando a mesma coisa que a menina quando chegou. Pensa, pensa. Não, mas as crianças eram idênticas, eu e essa mulher não somos iguais. No máximo, a pele e o cabelo são iguais, mas não o rosto… Pera aí, mas como é o meu rosto? Não tenho lembranças dele, e aqui não tem nenhum espelho. Não é possível. Ou será que é. Fico apreensiva, e quando a mulher vê que eu acordei, me traz água e pergunta se tá tudo bem, mas sinto a tensão nela. Pode até não ter certeza, mas está pensando exatamente na mesma coisa que eu. Só pode haver uma. Me levanto fingindo pelo menos um pouco de calma e tento me afastar dela, não demorando muito a perceber que ela carrega uma faca. Me desespero totalmente, e começo a correr, mas vou correr para onde? Para completar, o espaço dos dois cômodos fica cada vez menor a cada momento. Então no desespero, sem outra rota de fuga, vou correndo até a janela e pulo.

Então caio, e caio, e caio. Numa velocidade constante, porém ainda sem ver o chão. Continuo assim até perder a noção do tempo. Acima tudo branco, abaixo tudo cinza, e eu apenas continuo caindo em uma velocidade constante, e por incrível que pareça o desespero não vem do medo da queda, mas do medo do lugar que deixei pra trás. O que está acima de mim e abaixo parecem tão igualmente difusos, que não tenho mais noção de nada. Em algum momento, canso de cair, estico minha perna e coloco meu pé no chão. Vejo que o cinza que eu via não era algo muito longe, era um piso de metal. Tento andar pra frente, e bato em uma parede metálica cinza, que também parecia mais longe do que está. Todas as direções que vou são a mesma coisa, exceto uma, que tem uma seta brilhante apontando para cima. Estou em um elevador.